Fernando Molica
O Dia Rio - Na introdução do espetáculo, uma doce ironia: Bibi Ferreira sobe ao palco do Teatro Net Rio ao som de ‘Malandragem’ (Frejat-Cazuza), canção em que Cássia Eller dizia ser, quem sabe, uma garotinha. Às vésperas dos 90 anos, Bibi está longe de uma garotinha, mas não perdeu o humor. Logo no início do show, revela um episódio de sua vida e o situa no século 17.
Não é garotinha, mas no palco, de pé diante do microfone, não tem nada de velhinha. A voz continua jovem, clara e potente, capaz de acompanhar a orquestra em perigosos graves e em audaciosos agudos.
Ao longo de uma hora e quinze minutos, ela conta histórias e apresenta clássicos da música brasileira e internacional, entre eles, temas de ‘Hello Dolly’, ‘O homem de La Mancha’ e ‘Gota d’água’. E ainda brinca com óperas como o ‘Barbeiro de Sevilha’ — Bibi troca a letra de forma proposital, o que não a livra de percorrer todas as notas da partitura. Em outro momento, sem qualquer mudança de figurino ou de maquiagem, Bibi, atriz, fica a cara de Edith Piaf ao cantar algumas suas canções. “Ela (Piaf) me sustenta há 27 anos”, ressalta, entre risos. Não é preciso condescendência para gostar do espetáculo. Não é necessário dar qualquer desconto pelo fato de a estrela ter 89 anos. Quem se apresenta é uma artista cujo talento não requer paternalismo — como ela tem dito, está ali trabalhando, o teatro é seu ganha-pão. Rigorosa, não admitiria apresentar-se ao público sem condições.
Terminado o show, ela volta ao palco para receber uma nova leva de aplausos. Agradece, elogia a plateia e retorna aos bastidores, apoiada em seu empresário. Neste momento é como se a Bibi artista — aquela, de idade indefinível — desse lugar à senhora Abigail Izquierdo, uma quase nonagenária. A segurança demonstrada em cena é trocada por passos cuidadosos, as mãos buscam apoio nos braços de seu acompanhante. A cena apenas reafirma o talento da atriz capaz de interpretar uma mulher muito mais jovem.A vida é amiga da arte, disse Caetano Veloso.
Em 1923, um ano depois do nascimento de Bibi, a sinfonia ‘Vigília d’armas’, composta por Julio Reis (1863-1933), foi ouvida pela última vez num palco. Amanhã, às 19h, a peça será executada pela Orquestra Sinfônica UniRio regida pelo maestro Branco Bernardes. O concerto será na Sala Villa-Lobos, na Avenida Pasteur 436, fundos. A entrada é franca.
Fernando Molica é jornalista e escritor |
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